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Gestão de Trabalho Híbrido e Teletrabalho: Riscos Ocultos e Soluções Jurídicas para Empresários

Por Allexsandre Gerent

Publicado em 05/02/2025
Gestão de Trabalho Híbrido e Teletrabalho: Riscos Ocultos e Soluções Jurídicas para Empresários

A adoção de modelos de trabalho híbrido e teletrabalho tem se consolidado no cenário empresarial brasileiro, impulsionada por fatores como a pandemia de COVID-19 e os avanços tecnológicos. Embora essas modalidades ofereçam flexibilidade e potencial aumento de produtividade, elas também apresentam desafios jurídicos que exigem atenção dos empresários para evitar passivos trabalhistas.

De acordo com o IBGE, em 2022, aproximadamente 7,4 milhões de pessoas estavam em teletrabalho no Brasil, representando 7,6% dos trabalhadores ocupados. Em Santa Catarina, 378 mil pessoas realizaram trabalho remoto no mesmo período, das quais 254 mil utilizaram equipamentos digitais, caracterizando o teletrabalho. Esses números reforçam a relevância do tema, especialmente em setores como tecnologia, serviços financeiros e saúde, que lideram a implementação do trabalho remoto no Brasil.

No âmbito jurídico, o trabalho híbrido e o teletrabalho apresentam desafios específicos que devem ser enfrentados com uma abordagem estratégica e preventiva. Entre os principais pontos de atenção, destaca-se o controle de jornada e o pagamento de horas extras. Apesar de o art. 62, III, da CLT prever que trabalhadores em teletrabalho não estão sujeitos a controle de jornada, a jurisprudência tem reconhecido o direito a horas extras quando há mecanismos de monitoramento, como sistemas de login, e-mails corporativos ou softwares de gestão. Por exemplo, no Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, no processo nº 0011045-62.2021.5.03.0182, um caso envolvendo regime híbrido resultou na condenação da empresa ao pagamento de horas extras, demonstrando que a prática de monitoramento pode caracterizar controle de jornada.

Outro tema relevante é o direito à desconexão, que, embora não tenha previsão expressa na legislação brasileira, vem sendo reconhecido pelos tribunais com base nos princípios da dignidade da pessoa humana e da saúde do trabalhador. No Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, no processo nº 1000123-89.2020.5.02.0712, um empregado que era acionado constantemente fora do expediente por aplicativos de mensagens obteve indenização por danos morais devido à violação desse direito. Além disso, a ergonomia e a saúde ocupacional no teletrabalho são de responsabilidade do empregador. A falta de mobiliário ergonômico ou orientações adequadas pode gerar doenças ocupacionais, como em um caso julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, no processo nº 0011045-62.2021.5.03.0182, que reconheceu a responsabilidade de uma empresa por lesão por esforço repetitivo desenvolvida por uma funcionária em teletrabalho.

Outro ponto de atenção para os empresários é a definição dos custos do trabalho remoto. A CLT, em seu art. 75-D, exige que o contrato de teletrabalho disponha sobre a aquisição, manutenção e fornecimento de equipamentos tecnológicos e infraestrutura necessários. A omissão nesse ponto pode gerar disputas, como ocorreu no Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, no processo nº 0001234-56.2020.5.09.0012, que determinou que uma empresa reembolsasse um empregado pelas despesas com internet e energia elétrica, devido à ausência de previsão contratual específica.

Para salvaguardar os interesses dos empresários, é essencial adotar medidas preventivas e estratégias bem estruturadas. A primeira medida é elaborar contratos de trabalho detalhados, que contemplem as especificidades do teletrabalho e do regime híbrido. O contrato deve prever a jornada de trabalho, o direito à desconexão, as responsabilidades pelas despesas e o uso adequado dos equipamentos fornecidos pela empresa. A ausência de cláusulas claras sobre esses pontos pode resultar em passivos trabalhistas.

Além disso, a implementação de políticas internas é fundamental para estabelecer diretrizes claras. Tais políticas devem tratar de temas como horários de comunicação, medidas ergonômicas, controle de jornada e procedimentos para reporte de acidentes de trabalho ocorridos no ambiente remoto. Políticas bem elaboradas não apenas reduzem os riscos de litígios, mas também demonstram o compromisso da empresa com o bem-estar e a segurança de seus colaboradores.

Treinamentos periódicos também são cruciais para educar os trabalhadores sobre os seus direitos e deveres, especialmente em relação à ergonomia, saúde mental e boas práticas no teletrabalho. Empresas que promovem programas de conscientização reduzem significativamente a incidência de doenças ocupacionais e criam um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo.

No campo internacional, legislações de países como França, Espanha e Alemanha reforçam a necessidade de políticas claras sobre o direito à desconexão, enquanto os Estados Unidos destacam a importância de reembolsar despesas operacionais e o Japão foca na saúde mental dos empregados remotos. Essas práticas podem ser adaptadas à realidade brasileira e integradas às políticas internas das empresas, fortalecendo a segurança jurídica e a competitividade no mercado.

Adicionalmente, a realização de auditorias jurídicas periódicas é uma ferramenta valiosa para identificar possíveis vulnerabilidades nos contratos, políticas e práticas empresariais. Uma auditoria bem conduzida permite corrigir eventuais falhas antes que elas se transformem em litígios, garantindo maior conformidade com a legislação trabalhista.

Por fim, a transição para o trabalho híbrido e o teletrabalho exige dos empresários não apenas uma visão estratégica, mas também um compromisso contínuo com a atualização e adequação às melhores práticas e jurisprudências. A combinação de regulamentações nacionais e internacionais, aliada a um planejamento preventivo, oferece aos empresários as ferramentas necessárias para alinhar produtividade, segurança jurídica e bem-estar dos trabalhadores. 

Allexsandre Gerent é conselheiro da CDL Florianópolis, advogado (OAB/SC 11.217), sócio fundador da Gerent Advocacia Trabalhista, professor, pós-graduado em direito do trabalho e direito tributário, mestre em ciências políticas.

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